Li três livros de Pauline Alphen

Outro clube de leitura

No post anterior falei do professor Carlos e do convite que ele me fez para visitar sua escola e conhecer seus alunos. Ele mora em São José dos Campos, interior de São Paulo. Trocamos alguns e-mails e deixamos essa visita para o começo do ano que vem. Na escola dele já vai começar o calendário de avaliação final e este final de ano está cheio de feriados. Num dos e-mails que mandei pra ele, perguntei:

Professor, o que você acha de escolher um livro pra eu ler e os seus alunos também, e depois publicar no blog? Tipo aquele clube de leitura que fiz com a escola daqui.

E ele respondeu:

Gostei muito da ideia, Heitor! Vou colocar essa atividade no meu planejamento de 2013, para acontecer logo no início. Juntamente com os estudantes escolheremos um livro bem legal. Vai ser muito motivadora essa atividade.

OBA! No começo do ano vamos ter outro clube de leitura aqui no blog.

Uma escritora meio francesa e meio brasileira

Pauline Alphen nasceu no Rio de Janeiro. De pai francês e mãe brasileira, ainda criança, foi morar na França. Só voltou pra cá aos onze anos, veio passar férias na casa da madrinha brasileira, em Alagoas. Veio sozinha! Pauline morava em Metz, fronteira com a Alemanha. Primeiro ela foi com sua mãe, de trem, até a capital, Paris, para pegar o avião. No aeroporto foi entregue a uma aeromoça que pegou a sua mão. A mão da aeromoça era quente e dizia para Pauline: venha venha venha.

E ela foi para dentro do avião. “Minha mãe já ficou longe, minha mãe de olhos brilhando, que chorava e ria quando me abraçou. Ficou lá no país onde cresci. (…) Estou no avião que vai me levar para o Brasil, o país onde nasci, mas pouco sei.” Assim começa a viagem de férias no Brasil de Pauline Alphen, que ela conta no livro Do outro lado do Atlântico, que tem ilustrações de Maria Eugenia, foi publicado pela Companhia das Letrinhas e faz parte da Coleção Memória e História.

Conheci a Pauline Alphen na Bienal do Livro e assisti a sua palestra. Ela contou que foi um professor de francês que despertou nela o desejo de escrever e ela tinha dez anos quando isso aconteceu. Ela disse que escreve para despertar emoção no leitor e que todo escritor quer que o seu livro seja lido pelo maior número de pessoas. Para escrever o texto de Do outro lado do Atlântico ela conta que convocou a sua memória. Concentrou-se e pediu à menina de onze anos que viesse lhe contar com tinha sido aquela viagem. Misturou memória e imaginação e já não sabia o que era “verdade” e o que era “mentira”. Daí percebeu que isso não tinha importância, porque era tudo isso, “menina, mulher, verdade e mentira”. E isso é história.

Peguei um autógrafo da Pauline Alphen! Mais um livro para minha coleção de livros autografados. Ela escreveu que era “uma dedicatória comovida”, pois “é a primeira vez que escrevo para um personagem”. Eu também fiquei comovido… E isso sempre acontece comigo quando encontro um escritor de verdade.

Gostei tanto desse livro de Pauline Alphen e do jeito que ela escreve que fui procurar outros livros dela pra ler. Peguei mais dois, A porta estava aberta e A odalisca e o elefante. Já li, adorei e também vou falar deles.

O livro A porta estava aberta, escrito por Pauline Alphen, ilustrado por Jean-Claude Alphen, irmão de Pauline, e publicado pela Companhia das Letrinhas começa com o enterro do “Vovô Tuca”. Paulo tinha ido ao enterro e contava pra sua prima Clara como foi.

– Foi a maior confusão! Primeiro a gente demorou pra caramba para achar o lugar da cremação…

– Da que?

– Cre-ma-ção. Quer dizer que em vez de ser enterrado, o vovô foi queimado.

– Ai! – fez Clara, com uma careta. – Doeu muito?

– Que boba! Ele não sentia mais nada. Foi só o corpo dele. O vovô Tuca já não estava ali.

– Ah… E onde ele estava então?

O Paulo suspirou, ele tinha nove anos, Clara tinha sete e fazia um milhão de perguntas por minuto.

Para tentar resolver essa questão e acalmar a curiosidade da prima, o Paulo disse:

– É que ninguém sabe direito dessas coisas, Clarinha. O que acontece depois que alguém morre ou antes de alguém viver… É assim… um mistério.

E a conversa continuou, com o Paulo contando todos os detalhes da historia do enterro e a Clara interrompendo toda hora com suas perguntas. Até chegar na história do irmão do Paulo que estava pra nascer. A mãe dele grávida teve que ser levada às pressas do cemitério para a maternidade. O Paulo fez de tudo para explicar pra Clara, mas ela não conseguiu entender esse outro mistério da vida.

Esse é só o começo dessa história, um dia Paulo estava brincando de esconde-esconde com sua prima e procurando um lugar na casa para se esconder, quando encontra aberta a porta do escritório do avô. “O cômodo proibido, fechado, onde ele nunca tivera permissão para entrar!” A partir daí começa a parte mais legal desse livro, Paulo descobre a árvore genealógica de sua família, construída pelo seu avô e encontra muitos outros mistérios da vida dentro do escritório proibido.

A odalisca e o elefante, escrito por Pauline Alphen e publicado pela Cia das Letras conta a história de amor de Hati e Leila. Hati era um elefante branco que quando criança vivia nas savanas da África e tinha sonhos estranhos. “Quando todos os seus estavam dormindo, gostosamente aninhados uns nos outros, ele acordava aflito como se alguém ou alguma coisa o estivesse chamando. Alongava as magníficas orelhas, afinava o olhar, procurava, procurava…”, mas não encontrava nada.

Leila era uma menina muito pequena e muito bonita, que herdara do seu pai a mania de pensar: “ela pensava um bocado.” Vivia no castelo do sultão e aprendia com um eunuco muito gordo e muito rosa a profissão de odalisca: “Não façam isso, façam aquilo. Baixem os olhos… Assim, garotas, assim! A mão, a mão! Leve! Discreto o sorriso, sinuosos os quadris… Aprender a profissão de Odalisca não é bolinho.”

“Acontece que o tempo fez o que já então não se cansava de fazer: passou. Passou, passou e passou.” Hati foi parar no castelo do sultão, Leila cresceu e os dois se apaixonaram. Sobre isso, a odalisca, que como já sabemos gostava de pensar, pensou:

“Odaliscas não costumam se apaixonar por elefantes. Nos contos de Sherazade, moças se apaixonam o tempo todo, parece até que não fazem outra coisa na vida. É só aparecer um rapaz de um certo jeito que tchabum! Provavelmente, se tivesse sentido frio e calor e todas essas coisas que já sabemos por um mancebo esbelto como um bambu, pele da cor da tâmara mais fresca, sobrancelhas que se beijam e, num cantinho dos lábios, um sinal como uma gota de âmbar…” Mas um elefante branco! A partir desse amor impossível entram na história de A odalisca e o elefante, outros casais famosos da literatura, que também tiveram seus amores impossíveis.

Pauline Alphen é escritora, roteirista, tradutora e jornalista. Filha de pai francês e mãe alagoana, nasceu no Rio de Janeiro em 1961 e ainda criança foi morar na França. Aos treze anos voltou a morar no Brasil e viveu a adolescência em São Paulo. Estudou jornalismo e depois retornou à França e mora lá até hoje, mas sempre vem passar umas temporadas por aqui. Além de A odalisca e o elefante, Do outro lado do Atlântico e A porta estava aberta, publicados pela Companhia das Letras, escreveu também Cabeça de Sol em parceria com seu irmão Jean-Claude R. Alphen, publicado pela Editora Rocco, e neste ano lançou Os gêmeos, também publicado pela Companhia das Letras. Em francês ela escreveu Gabriel et Gabriel e Salicande, da série Les Eveilleurs, que recebeu dois prêmios – Les Imaginales e  Elbakin – de melhor romance de fantasia para jovens em 2010.

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