Ganhei mais livros das editoras

No final do ano eu falei aqui, que duas professoras tinham procurado o pessoal da Sintaxe* para fazer algum trabalho com o blog. Pois é, parece que a coisa vai dar certo! Eles me falaram que com uma professora o projeto avançou, mas eu não posso contar nada, ainda, “faltam fechar alguns detalhes importantes”, eles me disseram. E me fizeram prometer que eu ia esperar a autorização deles para falar qualquer coisa aqui. Só o que eu posso dizer é que o projeto é bem legal! Estou muito feliz com o que vamos fazer aqui no blog. É muito bacana, mesmo! Vai ser tipo, um clube. Vocês vão ver! Estou louco para contar tudo, mas ainda não posso. Eu prometi!    

Outro dia eu contei num post que eu tinha ganhado um livro de uma editora. Na semana passada eu ganhei mais três, de outras editoras. A Marilu, uma jornalista e assessora de imprensa, que até já colocou comentário aqui no blog, ligou para a Sintaxe e pediu o meu endereço: – Vocês podem me passar o endereço do Heitor? Eu quero mandar uns livros para ele. E ela mandou, mesmo! Os livros já chegaram. E vieram do mesmo jeito que chegou o outro. Pelo correio e com o meu nome no envelope: “Para o Blog do Le-Heitor”. Este blog só me dá alegria! Eu já disse, foi o melhor presente que eu ganhei nos últimos tempos. Já li os três livros que a Marilu me deu, gostei muito e hoje vou falar deles.

São dois livros da editora Cia dos Livros e outro da Cortez Editora. Vou começar falando de Os olhos mágicos do João, escrito por Marô Barbieri, com ilustrações de Ana Terra e publicado pela Cia dos Livros. Com a história desse livro eu aprendi que as coisas são como a gente vê, depende de como a gente olha pra tudo. Uma vez, esse João de olhos mágicos olhou para umas latas e tampinhas espalhadas pelo chão e viu um trem bem comprido, com uma locomotiva apitando e subindo o morro. Para esse João, qualquer coisa era outra coisa, ele piscava os olhos e logo aparecia uma coisa nova no seu pensamento. Outra vez, uns pedaços de papéis voaram com o vento e o João viu fantasmas gargalhando na sua frente e brincando de esconde-esconde. Esse João via cada coisa! Sempre inventando o que via e fazendo mudanças pro mundo ficar mais bonito.

O outro livro, também publicado pela Cia dos Livros é o Danico, o cão nanico. Escrito por Alexandre Rodrigues, com ilustrações de Ari Nicolosi, este livro conta uma história em rimas, como uma poesia. Deve dar muito trabalho escrever um livro assim. O escritor tem que buscar a palavra certa para colocar no lugar e rimar. Mas é muito gostoso ler livros que contam histórias com rimas. Quando eu era criança (já disse, hoje sou pré-adolescente) e ainda não sabia ler, eu adorava quando minha mãe lia esses livros rimados para mim. Eu ouvia o som das palavras, na voz dela, e imaginava um monte de coisas. Criava histórias em cima das histórias que ela me contava, feito o menino João, da história do outro livro. O Danico deste livro era um filhote que brincava com penico, comia todas as roupas da casa e fazia muita confusão. Não obedecia ninguém, era malcriado, não queria ser ensinado e se vestia de pato e de macaco. Um dia ele cresceu, saiu de casa, ficou com medo e sua vida se transformou. Mas essa parte eu não vou contar, está lá no livro, o que no final, aconteceu com o Danico.

O terceiro livro é o Perdidos e guardados, publicado pela Cortez Editora, escrito por Erica Pontes e com ilustrações de Alexandra Fernandes, a Leka. Este livro conta a história da Bia, uma menina que adorava sonhar e que inventou uma brincadeira diferente. Ela, de repente, começou a achar o que os outros perdiam e guardar tudo em uma caixa bem grande, que ficava escondida no fundo do armário. No começo ela guardou alguns objetos comuns, que ficavam pela casa: borracha gasta, moeda antiga, alfinete de fralda, recorte de revista. Mas, depois, a menina começou a perceber que as pessoas, sempre distraídas, perdiam objetos muito importantes. Então ela decidiu guardar esses objetos até que o dono se lembrasse e desejasse reaver esse tesouro esquecido. Do papai, ela guardou uma bola de queimada bem antiga, com as lembranças do tempo em que ele era menino. Da mamãe, um laço de fita lilás e o desejo de ser a primeira bailarina. E assim Bia foi guardando tudo. Uma gota de lágrima da vovó num xale de renda. O medo do vovô de envelhecer e não ser mais útil, ela também conseguiu guardar na caixa. E assim foi, guardou lembranças da professora, da melhor amiga… Até que a caixa ficou muito pequena para guardar tantos tesouros e então a menina teve uma ideia para resolver esse problema. E a ideia da Bia está lá, nesse livro, revelando a importância desses nossos tesouros.

*A Sintaxe é a assessoria de imprensa que criou e me deu de presente este blog. Eles cuidam das mudanças e também divulgam.

Li Os meninos da rua Paulo

No ano passado derrubaram umas casas da minha rua para construir um prédio. As casas foram derrubadas, mas a construção do prédio demorou para começar. Acho que foi problema de alvará, pelo menos foi o que eu ouvi falar. Nesse tempo, o terreno ficou vazio e os meninos maiores começaram a entrar lá para jogar bola. Os grandões – como chamamos os meninos mais velhos – ocuparam o terreno. Depois, eu e minha turma aproveitamos a ocupação e usamos o terreno como nosso campinho, também. O moço que tomava conta, no começo ficou bravo, mas depois ele falou com o engenheiro da construtora e eles deixaram a gente brincar no terreno vazio, enquanto não começava a construção. Essa brincadeira durou um bom tempo e foi bem legal. Até jogo contra marcamos lá! Hoje o prédio já está em construção e perdemos o nosso campinho. Eu me lembrei desta história por causa de um livro muito legal, mas muito legal, mesmo, que eu li nesta semana.

Eu li Os meninos da rua Paulo, do escritor húngaro Ferenc Molnár, publicado pela editora Cosac Naify. A história deste livro se passa em Budapeste, na Hungria, em 1889. Um grupo de meninos ocupa um terreno baldio para brincar e neste terreno eles criam um monte de histórias, brincam, jogam péla – um jogo parecido com o tênis – e fazem as reuniões de um clube, a Sociedade do Betume. Até um exército montam lá para defender o grund – como eles chamam o lugar – da invasão de outro grupo de meninos.

A turma era formada pelo Boka, o chefe; o Csele; o Csónakos; o Weiss; o Geréb; o Barabás; o Csengey; o Nemecsek, o lourinho, personagem muito importante da história; e muitos outros. Nemecsek era o único soldado raso, os outros eram todos oficiais. Era ele quem recebia as ordens de toda turma. Para não dizer que ele era o único, havia outro em quem todos mandavam: o cachorro que vivia no terreno e que também era um soldado raso. Advinha qual era o nome desse cachorro… Heitor! Heitor era o nome do cachorro. Lendo o livro muitas vezes eu quis ser o Nemecsek, mas com esse cachorro na história, ficou difícil de imaginar.

O livro começa contando o fim de uma aula de química. As aulas acabavam a uma hora e faltavam quinze minutos para ela terminar. Nessa hora o som de uma pianola entrou pela janela tocando uma alegre canção húngara e todos começaram a sorrir e a se agitar. Arrumavam, guardavam o material e se aprontavam para sair, assim que o sinal tocasse. Já estavam prestando mais atenção ao que acontecia fora da sala do que ao que o professor dizia. Neste momento o professor interrompeu a bagunça e perguntou: – O que é que há? E todos voltaram a ficar em silêncio e imóveis, sentados nas carteiras. O professor então pediu que o Csengey, que era o monitor, fechasse a janela. Nesse momento Csónakos pediu a Nemecsek que passasse um bilhete para o Boka. No bilhete estava escrito: Às três da tarde, assembléia geral. Eleição do presidente, no grund. Divulgar. Todas as tardes eles frequentavam o grund e era lá que brincavam e viviam as suas aventuras.   

A história é contada pelo autor, que algumas vezes parece ter feito parte daquela turma. Eu acho que aquela era a turma de Ferenc Molnár, quando ele era criança. Molnár nasceu na Hungria em 1878, trabalhou como jornalista, estudou direito em Genebra e aos 20 anos já publicava contos e poemas. Publicou Os meninos da rua Paulo em 1907. Por causa da guerra foi para os Estados Unidos em 1939 e morreu em Nova York em 1952. Este livro chegou ao Brasil em 1952, traduzido por Paulo Rónai, que também nasceu na Hungria, na cidade de Budapeste, onde se passa essa história, e em 1907, ano da primeira publicação deste livro. Paulo Rónai cresceu em Budapeste lendo os livros de Ferenc Molnár. Foi professor de latim e estudou literatura clássica, francês, italiano e húngaro. Aprendeu português, veio para o Brasil em 1941, também por causa da guerra, e naturalizou-se brasileiro. Tradutor, escritor e pensador, Paulo Rónai foi o grande divulgador da literatura brasileira no leste europeu e da literatura de lá, aqui. Ele morreu em Nova Friburgo (RJ) em 1992.

Os meninos da rua Paulo formaram um exército e conseguiram defender o seu grund da invasão dos meninos do Jardim Botânico, que queriam ocupar o terreno baldio para jogar péla. Mas, no final da história, não conseguiram defender o lugar de uma ameaça maior: construíram no terreno um prédio de quatro andares o que acabou de vez com o sonho dos meninos (isso é contado logo no começo do livro, por isso não estraguei o final da história, tá!). Esse final me fez lembrar o meu grund atual: a biblioteca do meu bairro. É na minha biblioteca que eu encontro muitos livros legais e vivo as minhas aventuras. E como em Budapeste de 1889, hoje querem destruir, como destruíram o sonho dos meninos de lá, os meus sonhos daqui. Como já disse em outros posts, a prefeitura quer vender o terreno onde fica a biblioteca para construir um prédio no lugar. Vou convocar o exército dos meninos da rua Paulo para defender a minha biblioteca! Vou pedir a ajuda deles e quem sabe, desta vez, a gente consegue vencer. Quem quiser apoiar a “nossa luta” pode colocar seu nome no abaixo assinado que está no link: http://www.abaixoassinado.org/abaixoassinados/7756

Li um conto fantástico de Murilo Rubião

Hoje vou falar de um conto bem bacana que eu li nesta semana, mas antes quero contar como foi a audiência pública na Câmara, em defesa da biblioteca e do quarteirão da cultura do meu bairro. Na semana passada eu fui à Câmara Municipal, meu pai me levou! A sala estava cheia e vi algumas pessoas que também participaram da passeata, que eu contei no post anterior. Muita gente falou, eu prestei atenção e anotei algumas coisas para contar aqui no blog.

Um promotor está encaminhando um inquérito civil – eu acho que é esse o nome – para entrar com uma ação judicial, no caso do projeto de desapropriação ser encaminhado para votação dos vereadores. Ele vai mostrar que o quarteirão é um bem público, que deve ser preservado.

Uma arquiteta está preparando o projeto de tombamento do espaço. Esse projeto quer provar que o quarteirão é patrimônio histórico e cultural. Se o processo de tombamento for iniciado, ninguém pode mexer no quarteirão até que o projeto seja avaliado.

A organização do movimento está preparando outras manifestações e conversas com os vereadores e também está passando um abaixo-assinado. Sai bastante animado de lá. Tem muita gente lutando pela minha biblioteca. Meu pai me falou que essa é a minha primeira luta política e eu estou gostando muito dela!

Mas a minha leitura continua e nesta semana li o conto O ex-mágico da taberna Minhota, do escritor mineiro Murilo Rubião, em um livro publicado pela Editora DCL e ilustrado por Ana Raquel. Esse conto foi publicado pela primeira vez no livro o Ex-mágico, em 1947. Eu comentei com a Maria Viana, que editou esse livro da DCL, que eu ia escrever sobre o Murilo Rubião no blog. Conheci a Maria na Bienal e já falei dela aqui (http://blogdoleheitor.sintaxe.com.br/?p=308). Conversei com ela pelo telefone e depois mandei um e-mail. Ela respondeu o meu e-mail:

“Oi, Heitor. Fiquei muito contente ao saber que você leu o Ex-mágico da Taberna Minhota. O Murilo Rubião reescrevia muito suas histórias antes de publicá-las em livros. Entre 1939-1944, ele se correspondeu com Mário de Andrade, para quem enviava suas histórias e compartilhava suas dificuldades de escrever. Em uma visita a um sebo em Belo Horizonte, encontrei um livro organizado pelo professor Marcos Antonio de Moraes, intitulado Mário e o Pirotécnico Aprendiz. Seguem trechos de duas dessas cartas. Espero que você leia outras histórias escritas pelo Murilo Rubião. Quando eu tinha a sua idade, li “Teleco, o coelhinho” e gostei muito.

Trecho de carta endereçada a Mário de Andrade em que o contista mineiro escreve sobre seu processo criativo

Belo Horizonte, 23 jul. 1943

Mário de Andrade

(…) Ainda não consegui, após cinco anos de uma luta feroz com a literatura de ficção, realizar um conto definitivo. (…) Infelizmente, escrever é para mim a pior das torturas. Uma simples carta, como esta, me custa sangue, suor e um sacrifício imenso. Arranco, de dentro de mim as palavras a poder de força e alicates. Por outro lado, a minha imaginação é fácil, estranhamente fácil. Construo meus “casos” em poucos segundos. E levo meses para transformá-los em obras literárias. Daí meus defeitos. Achando facilidade em inventar e dificuldade em escrever, cuido quase exclusivamente da última. Mas, agora, sinto que o meu instrumento está melhorando e que já posso cuidar melhor da “invenção”.

Trecho da resposta de Mário de Andrade para Murilo Rubião

São Paulo, 5 abr. 1944

Murilo Rubião,

(…) Mas afinal das contas, Murilo Rubião, não será isso mesmo, o sofrimento de artista como arte, a pedra de toque provando a existência do artista em você?… Não dá a medida do valor, eu sei, isso depende até de elementos que independem do próprio artista infelizmente – mas o sofrimento prova a existência, a legitimidade do artista. Não creio possível o artista sem dor, a arte sem dor. Essa dor de fazer, essa dúvida, essa insatisfação, essa luta pelo melhor, essa inquietação pelo ainda melhor que pode surgir já tarde, essa angústia da eterna pergunta eternamente sem resposta: “estará bom?”

Adorei o e-mail da Maria, os trechos das cartas e a contribuição que ela deu para o meu blog! Vou ler outros contos do Murilo Rubião.

Descobri Murilo Rubião pesquisando sobre literatura fantástica. Ele é considerado precursor e um dos principais representantes deste gênero no Brasil. Eu já falei aqui de uns livros de literatura fantástica que eu li. Foram dois escritores brasileiros e um inglês e estão no post “Li três romances fantásticos”  (http://blogdoleheitor.sintaxe.com.br/?p=579). As histórias contadas na literatura de ficção são sempre inventadas, mas poderiam ser de verdade. Por exemplo, as coisas que acontecem na cidade de Itaguaí, no livro O Alienista, do Machado de Assis (http://blogdoleheitor.sintaxe.com.br/?p=674),  são exageradas, mas poderiam ser verdadeiras. Não poderiam? Agora, um mágico tirar do bolso o dono de um restaurante!? E foi isso que fez o ex-mágico da taberna Minhota do Murilo Rubião. E ele nem se espantou. O dono do restaurante, sim, assustado perguntou como o mágico tinha feito aquilo e em seguida lhe deu um emprego: a partir daquele dia ele passou a divertir, com as suas mágicas, os frequentadores da casa.

Mas o mágico não durou muito por lá e foi logo demitido. Ele só dava prejuízo ao dono da casa, pois tirava do paletó almoços gratuitos para os espectadores. De lá ele foi trabalhar no Circo-Parque Andaluz, suas apresentações empolgaram as multidões e deram muito lucro ao dono da companhia.  No circo ele tirava do chapéu coelhos, cobras, lagartos… e no último número fazia aparecer entre os dedos um jacaré, apertava o animal pelas pontas, o transformava numa sanfona e encerrava o espetáculo tocando o Hino Nacional da Cochinchina. Com tudo isso, o mágico ficou muito famoso, mas mesmo assim, ele, que já era uma pessoa triste, com o sucesso, ficou pior, sua vida se tornou insuportável e é o que ele conta nesse conto.

Murilo Rubião nasceu em Carmo de Minas em 1916. Formou-se em Direito em 1942, foi jornalista e trabalhou na Folha de Minas. Foi chefe de Gabinete do governador Juscelino Kubitschek e adido na embaixada do Brasil na Espanha.  Criou e dirigiu o Suplemento Literário de Minas Gerais de 1966 a 1969. Publicou os livros O ex-mágico, A estrela vermelha, Os dragões e outros contos, O pirotécnico Zacarias, O convidado, A casa do girassol vermelho e O homem do boné cinzento e outras histórias. Morreu em Belo Horizonte em 1991.