Hoje começaremos outro clube de leitura com os alunos da Escola Municipal Luiz Gatti, de Belo Horizonte. Vamos conversar sobre o livro “Visita à baleia”, de Paulo Venturelli. Também publiquei, no final deste post, a entrevista coletiva que fizemos com o autor. O clube de leitura funciona assim, eu posto sobre o livro e o autor, na sequência, os alunos, que leram e trabalharam esse livro com as professoras em sala de aula, escrevem os seus comentários. Se alguém mais quiser comentar e participar do clube, também pode, mesmo não sendo aluno da escola.
HOJE É DIA DE CLUBE DE LEITURA!
Desde que comecei essa nova fase do blog, tenho procurado priorizar os posts de projetos de leitura, nesse tempo, já participei de diversos encontros do clube de leitura para jovens da Biblioteca de São Paulo e hoje, vamos retomar um projeto antigo, os clubes de leitura que faço com os alunos da professora Luciana, do Luiz Gatti. Mas também não quero abandonar os posts que escrevo sobre os livros que leio, as minhas resenhas. Foi isso que o meu amigo Lipe veio me cobrar outro dia:
– Heitor, você precisa escrever mais resenhas no blog e falar dos livros que tem lido.
– Ando meio desanimado, leio, mas não consigo escrever.
– Se eu puder ajudar…
Aproveitei e já escalei o meu amigo:
– Demorô! (…) Estou precisando de uma força para o clube de leitura, vamos fazer um clube com um livro do escritor Paulo Venturelli, o “Visita à baleia”, e queria que você lesse, também, pra gente conversar depois.
– Com quem vai ser esse clube?
– Com os alunos da professora Luciana.
– A de BH?
– Essa mesma! Você topa?
– Claro que topo, eu sempre participei dos clubes da professora Luciana, e não quero ficar de fora desse.
Emprestei o livro para o Lipe, que leu rapidinho e no dia seguinte já veio conversar comigo:
– Gostei do César, o personagem do livro, me lembrou do Paulo Loco, que às vezes faz o contrário do que a professora pede e acaba na diretoria.
– Também achei da hora a história que ele escreveu para a composição, era assim que eles chamavam antigamente a redação, parece que a história da redação é a inventada e a do livro é a verdadeira.
– As duas são inventadas!
– É claro que são… Só disse que parece…
E a nossa conversa foi longe, seguimos um roteiro que a professora Luciana me passou – de como ela trabalha a literatura em sala de aula, discutimos os mínimos detalhes do livro, brigamos em algumas partes, mas concordamos na maioria, principalmente em uma: gostamos muito do “Visita à baleia”.
A baleia rompendo os muros da escola
O livro “Visita à baleia”, escrito por Paulo Venturelli, ilustrado por Nelson Cruz e publicado pela Editora Positivo animou o clube de leitura, com ele, conseguimos reunir mais de 300 leitores. No início, eram só os alunos da professora Luciana, que já são velhos parceiros, depois, a professora Consolação, que também dá aula no Luiz Gatti, trouxe os seus, são alunos do 6º e 7º anos e EJA, e no final, a professora Ângela, que leciona numa escola do SESI de Belo Horizonte, entrou com 35 alunos de sua turma do 5º ano. É o nosso clube de leitura (com a ajuda da baleia) rompendo os muros da escola!
Baleia aparece em uma cidade do interior
A história do “Visita à baleia” começa com o César, personagem principal e narrador do livro, terminando seus deveres da escola, quando seu pai, que voltava do trabalho, chega em casa com uma notícia que “eletrizou a família”:
– Pessoal, tem uma baleia lá no centro da cidade.
Essa notícia, por si só já seria eletrizante, e ficou ainda mais, pois a família morava em Brusque, cidade do interior de Santa Catarina.
Mas o pai não teve dúvidas e convocou a família toda:
– Vamos, vamos. Se aprontem que a gente vai até lá ver o bicho.
A mãe disse que o marido estava maluco e declinou do convite:
– Na nossa cidade nem tem mar, como é que vai ter baleia por aí?
O pai olhou para os filhos (César e seu irmão mais novo) de tal forma, que não tiveram outra escolha, senão fazer o que ele estava mandando.
Foram se aprontar, lavar os pés com água fria, para economizar a lenha do fogão e vestir a gandola, conjunto de calção e camisa feitos com o mesmo tecido. Duas coisas que César odiava.
E foram os três na bicicleta do pai, o mano na cestinha próxima do guidão e ele, de garupa, no bagageiro.
E assim começa a aventura dos três, contada pelo César, que nessa parte do livro, já contou a história do pai, que cortava lenha para o fogão feito de tijolos, enorme, que eles tinham em casa; dos presentes da avó, as gandolas, que ela trazia de Iguape e dava outro igualzinho ao irmão. Ele odiava os seus presentes, mas um dia ela lhe deu um que foi maravilha: um canivete. Uma história vai puxando a outra, e o César, além de contar a “história principal” do livro, vai contando outras, sempre muito engraçadas e divertidas.
“Visita à baleia” recebeu diversos prêmios: Prêmio FNLIJ 2013 nas categorias de Melhor Livro para a Criança e Melhor Ilustração (de Nelson Cruz), 2º lugar do Prêmio Jabuti 2013 na categoria Infantil, finalista do Prêmio Jabuti 2013 na categoria Ilustração de Livro Infantil e Juvenil, Prêmio 30 Melhores Livros Infantis do Ano de 2013 da revista Crescer, e Lista de Honra do IBBY 2014 – International Board on Books for Young People.
Entrevista coletiva
“Quanto mais eu leio, mais a minha cabeça fica cheia de ideias”
Entrevistamos o Paulo Venturelli!
Fizemos algumas perguntas (os alunos do Luiz Gatti, eu e o Lipe – por isso, entrevista coletiva), lhe enviamos e ele respondeu.
Clube de Leitura – Por que você decidiu fazer um livro contando um acontecimento de sua infância?
Paulo Venturelli – Não conto um acontecimento de minha infância. Apenas me baseio em lembranças. Vocês precisam lembrar que este livro é literatura, logo, uma obra de imaginação. Se eu contasse um fato seria jornalismo. Para ser literatura tem de ser ficção, ou seja, obra INVENTADA.
CdL – Você está pensando em escrever ou está escrevendo algum novo livro? Qual o tema?
PV– Estou sempre escrevendo. No momento, escrevo poemas para depois montar um livro. Escrevo também um romance com uma história meio trágica. E estou preparando um livro de contos sobre homens que não se acertam bem com a vida.
CdL – Você tem outra profissão, além de ser escritor?
PV – O que ganho como escritor não paga nem o papel que gasto. Até um tempo atrás fui professor de literatura brasileira na UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ. Agora vivo com meu salário de aposentado.
CdL – Você prefere escrever para qual público?
PV – Não escolho público quando escrevo. O que tenho em mente sou eu mesmo, ou seja, eu escrevo aquilo que eu gostaria de ler. Como sou multidão, escrevo sempre para estas inúmeras pessoas que habitam minha cabeça que ferve o tempo todo.
CdL – Você recebeu apoio de sua família e amigos para seguir a carreira de escritor?
PV – Sou filho de operários. Eles nem sabem o que é literatura. Foram pessoas pobres tendo que lutar duramente pela sobrevivência cotidiana. Na vida deles não havia espaço para arte. Não conto com meus amigos, que são poucos. Uma boa parte de CONHECIDOS em lugar de me apoiar, me boicota por inveja, já que ganhei vários prêmios com meus livros.
CdL – O que te levou a escrever livros?
PV – Desde a adolescência leio muito. Quanto mais eu leio, mais a minha cabeça fica cheia de ideias. Chega o momento em que preciso colocar para fora o mundo que pulsa lá dentro. Assim escrevo. Para desafogar as tempestades que ocorrem em minha mente.
CdL – Qual a sensação de ver pessoas lendo um livro escrito por você? E como você se sente ao saber que a história que você escreveu está sendo lida por muitas pessoas?
PV – Todo escritor escreve para ser lido. Livro publicado é filho no mundo. Se há gente lendo-o, fico feliz e espero levar algo de interessante para a vida das pessoas. Que enquanto me leem tenham contado com boas ideias, bons personagens e assim se estimulem a ler sempre e sempre. A leitura é um caminho formidável para a gente se entender e entender os outros. Quem lê esperneia, e quem esperneia não se deixa dominar. A leitura é uma forma de se viver duas vezes. Quanto mais alguém lê, mais vive, mais conhece mundos que vão além do seu pobre cotidiano. Literatura rompe todas as fronteiras e nos torna capazes de conviver com a diferença, superando preconceitos, racismos estúpidos e por aí vai.
CdL – Você se considera um escritor famoso?
PV – Não e nem estou preocupado com isto. Gosto da minha privacidade. Gosto de ficar no meu cantinho lendo e escrevendo. Ser famoso é ter uma vida pública e todo mundo bisbilhotando o que eu faço. Não quero isto. Quero manter minha liberdade de ir e vir sem ter jornalista atrás de mim o tempo todo.
CdL – Quanto tempo você levou para escrever o livro “Visita à baleia”?
PV – Uns 3 anos mais ou menos.
CdL – Como foi escolhido o ilustrador desse livro? Você já conhecia o Nelson Cruz?
PV – Isto é tarefa da editora. Eles escolhem o artista que faz um projeto e este é colocado à minha apreciação. Se eu aprovar, toca-se o barco e o livro sai lindo como o da baleia.
CdL – Você já pensou em transformar seu livro em filme? Se pensou, ele seria do gênero ação, aventura, comédia ou musical?
PV – Minha praia é escrever. Se alguém quiser transformar uma história minha numa outra linguagem, ótimo, dou apoio. Mas eu mesmo fazer isto não está no meu horizonte de expectativa.
CdL – Como você definiria seu livro em uma palavra?
PV – PAI.
CdL – O que você sente quando está lendo ou escrevendo um livro?
PV – Um misto de prazer e agonia. Acho sempre que poderia estar melhor do que fiz. Por isto demoro. E quando leio um livro de outro autor, fico me mordendo e pensando: puxa, por que eu não tive esta ideia antes dele? Adoro ler porque estimula minha criatividade. Da leitura sempre vem uma fagulha e esta pode ou não se transformar num livro meu.
CdL – Você gostou de ter visto uma baleia de perto, na sua cidade?
PV – Sou de Brusque, uma cidade sem mar. Logo, não vi baleia alguma. Como já escrevi acima, a história é fruto de minha imaginação.
CdL – Como surgiu seu interesse pela leitura e pela escrita?
PV – Um professor no ginásio incentivou a gente a ler. Dizia que a melhor forma de criar inteligência é lendo. Eu era um menino muito tímido. Então me agarrei nos livros para encontrar uma saída. A partir daí as ideias começaram a fervilhar e eu vi que não bastava ler, tinha também de complementar esta tarefa com outra: escrever. Assim, ler/escrever está associado à minha vida desde muito cedo. E eu agradeço àquele professor. Por causa dele, encontrei um caminho excelente para ser percorrido, um caminho que tornou minha vida um longo feriado e me traz muita satisfação. Leio vários livros ao mesmo tempo e uns 3 ou 4 por semana. Assim, estou sempre em contato com novidades e com a mente afiada para criar enredos novos.
PS – Também já fizemos um clube de leitura com o ilustrador desse livro, o Nelson Cruz, quem quiser ler: http://blogdoleheitor.sintaxe.com.br/nelson-cruz-no-clube-de-leitura/