Hoje vou falar do livro Um menino chamado Vlado, que a Marcia Camargos acabou de lançar, é um romance juvenil que conta a vida do jornalista Vladimir Herzog, já li e gostei muito, não é uma história com final feliz. Também vou falar do movimento de ocupação, contra o fechamento de 92 escolas estaduais, em São Paulo.
A ESCOLA É NOSSA!
Outro dia recebi um e-mail da Marcia Camargos:
Oi, Heitor, você que defende as bibliotecas contra o fechamento, precisa se pronunciar sobre as escolas ameaçadas de fechar e a resistência dos alunos. Bjs. – Ela já se pronunciou e apoiou com tudo esse movimento!
A Marcia é jornalista, historiadora e escritora, com 25 livros publicados, já falei de um livro dela aqui no blog. Ela é minha amiga, gosto muito dela e das coisas que escreve, sua militância política me inspira bastante, ela me ensinou a gostar de política, meu pai diria que a Marcia “fez a minha cabeça”. Foi ela que escreveu o texto de orelha do livro Os meninos da biblioteca, do qual sou o narrador. Nele conto a história de uma luta política que eu participei, a luta contra o fechamento da biblioteca pública do meu bairro.
Na mesma hora respondi ao e-mail da Marcia, depois fui visitar uma escola ocupada, acompanhei o movimento de perto, mas só agora vou me pronunciar.
Estudantes de São Paulo lutam contra o fechamento de escolas
Como todos sabem – saiu muita notícia na imprensa e comentários no Facebook – o movimento dos estudantes teve vitória parcial, o governador suspendeu a proposta de fechar as 92 escolas e de fazer, agora, a “reorganização” da rede de ensino, mas o movimento não ficou satisfeito, quer que o governador desista de vez dessa ideia.
Desde que entrei na luta em defesa da biblioteca do meu bairro, sempre que vejo alguma notícia sobre uma luta política, fico querendo saber mais. Notícias de jornal e opiniões nas redes sociais não me satisfazem, tenho que ver de perto e ouvir as pessoas que estão na luta. Por isso, fui ao “campo de batalha”, visitar uma escola, a Fernão Dias Paes, que fica no bairro de Pinheiros, em São Paulo.
Chegando lá, me apresentei, entrei numa roda de estudantes que estavam conversando e dei muita sorte. Alunos de uma escola de Mairiporã, cidade da grande São Paulo, foram se aconselhar com os alunos do Fernão, pois queriam ocupar sua escola, também. O movimento chegou a ocupar 213 colégios, em todo o Estado. Acompanhei a conversa deles e ouvi todas as orientações, e alguns conselhos de como eles deveriam se comportar com os colegas, com a família e com os professores.
No final da conversa, ainda alertaram de que a luta não seria nada fácil. Logo depois, chegou uma jornalista do jornal O Globo, pedindo uma entrevista, eles disseram que não estavam atendendo a imprensa, ela quis saber o porquê, e um deles respondeu: – Vocês deturpam tudo! Mesmo assim, ele conversou um pouco com a repórter, que deve ter conseguido tirar algumas informações.
As minhas lutas
Depois da luta em defesa da biblioteca do meu bairro, história que contei no livro, já participei de outras lutas políticas, como por exemplo, a construção do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca, o PMLLLB de São Paulo, como contei em alguns posts aqui no blog. O PMLLLB foi aprovado pela Câmara Municipal, sancionado pelo prefeito, e agora já é lei, mas ainda vamos ter que lutar por verba.
Já o quarteirão, onde fica a biblioteca do meu bairro, a lei que autorizava a sua venda foi declarada nula, mas seu tombamento foi só parcial, ainda estamos lutando pelo tombamento total, para garantir a permanência definitiva da biblioteca e de todos os serviços públicos que ficam naquele terreno.
A luta dos estudantes vai continuar
Quanto à ocupação das escolas, o governador tinha pedido, na justiça, a “reintegração”, para obrigar os estudantes a deixarem os colégios ocupados, mas o Tribunal de Justiça foi contra, o juiz Sergio Coimbra Schmidt, desembargador e relator do processo, contou a sua experiência para fazer a defesa. Em 1968 ele era aluno do 3º ano do Ginásio Estadual Vocacional Osvaldo Aranha e participou dos movimentos daquela época. É muito bom ter na Justiça, pessoas que participaram de lutas políticas, ainda mais quando lutaram do nosso lado.
A Justiça também suspendeu o projeto de “reorganização” escolar, mas nada está garantido, ainda, e os estudantes vão manter a mobilização. Eu vou continuar acompanhando e apoiando essa luta; contra o fechamento das 92 escolas; pelo cancelamento completo do plano do governo de “reorganizar” as escolas da rede; pela não punição de professores, alunos e apoiadores das ocupações; e pela punição dos policiais militares que agrediram os estudantes durante os protestos.
O MENINO VLADO
Fui ao lançamento da Marcia Camargos e ganhei um exemplar autografado de seu novo livro Um menino chamado Vlado, que tem ilustrações de Mirella Spinelli e foi publicado pela editora Autêntica, com o apoio do Instituto Vladimir Herzog.
Na dedicatória que a Marcia fez pra mim, ela alerta que essa é uma “história sem final feliz”. O livro conta a vida do jornalista Vladimir Herzog, desde a infância, a família fugindo da perseguição nazista aos judeus, durante a guerra; até ser morto no Brasil, em 1975, pela Ditadura Militar.
O Ivo, filho do Vladimir Herzog, estava lá, eu conversei com ele, ele me contou sobre o Instituto Vladimir Herzog, e quis saber mais da luta que eu participei para defender uma biblioteca e do livro Os meninos da biblioteca, e eu contei tudo pra ele!
A história de Vladimir Herzog
O livro Um menino chamado Vlado começa com o personagem Felipe tendo que fazer um trabalho para a escola sobre o período da Ditadura Militar no Brasil. Sem saber por onde começar, ele faz um monte de perguntas ao seu pai, Mário:
– Por que a TV e os jornais ficam falando do aniversário do golpe? – O que é uma ditadura? – O que os militares fizeram? – Quem foi Vladimir Hezog? – O que é anistia ampla, geral e irrestrita? – O que…
O seu pai, que viveu a fase final da ditadura, concordou em lhe contar algumas coisas a respeito desse período.
– O que exatamente você precisa saber?
– Tudo! – O Felipe respondeu e ainda acrescentou que procurou na internet, mas não sabia como fazer.
O pai foi trocando ideias com o filho e tentando achar um jeito de contar a história da ditadura brasileira, sabia que era um assunto que dava “pano para mangas” e ficaria muito difícil “abordar um tema tão complicado num trabalho de escola”. Precisava arrumar um “fio condutor” para contar essa história. Ele lembrou que o menino tinha citado o nome de Vladimir Herzog, perguntou se ele sabia quem era essa pessoa, o menino respondeu que não, só “sabia que se tratava de alguém cuja trajetória estava ligada de alguma forma à ditadura”. Foi então que o Mario teve uma ótima ideia:
– Vou te contar a história de um menino chamado Vlado.
No início, Felipe estranhou um pouco essa ideia e até perdeu a paciência com o pai, seu trabalho era sobre a ditadura e não sobre a história de um menino, mas aos poucos ele foi entendendo e ficou superinteressado pela história do menino Vlado.
Adorei o jeito como a Marcia contou a história do menino Vlado, ela criou dois personagens – Mário, o pai e Felipe, o filho -, e na conversa entre os dois, a história foi sendo contada. Também achei bem bacana a relação entre o pai e o filho, me lembrou da minha relação com meu pai, eu também converso bastante com ele, e já falamos desse assunto, também, da ditadura militar.
Ditadura nunca mais
Quando o Vladimir Herzog foi preso, torturado e morto, ele trabalhava na TV Cultura de São Paulo, era diretor de jornalismo, também era militante do Partido Comunista, isso aconteceu em outubro de 1975, fez 40 anos, e o livro da Marcia conta toda essa história. Naquele tempo e durante todo o período da ditadura, que foi de 1964 a 1985, era proibido participar de lutas políticas ou fazer oposição ao governo, os que fizeram foram perseguidos, e muitos torturados e mortos, como aconteceu com o Vladimir Herzog e tantos outros.
Lutar contra o fechamento de bibliotecas, como lutei junto dos meus companheiros, e lutar contra o fechamento de escolas, como estão lutando os alunos dos colégios estaduais de São Paulo, seriam batalhas muito perigosas, com o risco de a gente ser preso, torturado e morto. Portanto, ditadura e tortura nunca mais, “Abaixo a Ditadura”, como se dizia antigamente, e “Viva a Democracia”.
MUSEU DA LÍNGUA PORTUGUESA
Fiquei muito triste com o incêndio no Museu da Língua Portuguesa, soube que ainda morreu um bombeiro. Fui lá algumas vezes, até contei aqui no blog da minha primeira vez, foi pra ver a exposição do Fernando Pessoa: http://blogdoleheitor.sintaxe.com.br/?p=361. Nesse dia descobri o mundo das pessoas que falam e escrevem em português, como eu; e conheci os heterônimos do poeta português, personagens criados por ele, que também escreviam e até biografia tinham. Espero que o Museu da Língua Portuguesa seja recuperado e volte logo a funcionar.
FELIZ 2016
Este é meu último post do ano, vou sair de férias e volto no final de janeiro. Desejo a todos, boas festas e um feliz Ano Novo.
Extra, Extra: O Trono do Estudar
19 vozes em apoio aos estudantes de São Paulo
André Whoong, Arnaldo Antunes, Chico Buarque, Dado Villa-Lobos, Dani Black, Felipe Catto, Felipe Roseno, Fernando Anitelli, Hélio Flanders, Lucas Santtana, Lucas Silveira, Miranda Kassin, Paulo Miklos, Pedro Luís, Tetê Espíndola, Tiago Iorc, Tiê, Xuxa Levy e Zélia Duncan. Composição de Dani Black. Segue link do vídeo:
\”Pra ter escolha tem que ter escola\”