– Pai, posso ir ao Condephaat amanhã?
– O que vai ter lá?
– A prefeitura vai apresentar o projeto dela para os conselheiros.
– Aquele projeto da maquete que saiu no jornal?
– Deve ser.
– E quem vai apresentar?
– O secretário da prefeitura.
– Mas o Condephaat fica lá na Luz, ao lado da Sala São Paulo.
– Eu sei, eu olhei no Google.
– E como você vai pra lá?
– Você não pode me levar? É de manhã.
– Levar eu posso, mas não posso ficar. Até gostaria… queria ver a cara-de-pau desse secretário, mas tenho que trabalhar… Como você vai voltar?
– Eu volto com o João da biblioteca, ele também vai.
– Vou ligar para o João amanhã de manhã, pra saber se ele pode trazer você de volta. Se ele puder, tudo bem, pode ir.
– Oba!
Nesta semana fui ao Condephaat em mais um evento da minha luta política. O Condephaat é um conselho de defesa do patrimônio histórico, arqueológico, artístico, e turístico do Estado de São Paulo. Ele é formado por técnicos e especialistas, que cuidam da preservação dessas áreas no Estado. Eles se reúnem frequentemente para discutir os “assuntos em pauta”. O pedido de tombamento do quarteirão do meu bairro está lá para eles analisarem. A presidente do conselho disse que agora, as reuniões do Condephaat são abertas ao público, “essa abertura é muito recente” e o resultado de todas as decisões são publicadas.
Quem quiser pode ir lá assistir às reuniões e ouvir tudo que eles falam, mas não pode participar. “Ele é aberto, mas não é participativo.” Ficam mais de vinte conselheiros reunidos numa sala, em volta de uma mesa, “discutindo e analisando os processos”. Eu cheguei mais cedo e fiquei atrás, ouvindo a conversa deles. Muita gente vai assistir. Quando chegou a hora de a prefeitura apresentar o seu projeto da venda do nosso quarteirão, tinha tanta gente para assistir, que nós tivemos que ir para um auditório, no primeiro andar do prédio.
O secretário começou dizendo que não ia falar sobre o tombamento, pois essa questão quem vai decidir é o Condephaat, e o que for decidido, ele irá apoiar. Se o Condephaat decidir por tombar o quarteirão, como patrimônio histórico, ele disse que será o primeiro a aplaudir essa decisão. Nessa hora eu me lembrei do meu pai, que queria ver a cara-de-pau do secretário, e me deu vontade de levantar e falar “então estamos todos de acordo, vamos logo tombar o nosso quarteirão e voltar pra casa”. Mas eu não podia falar nada, a presidente disse que a reunião não era participativa. Depois ele falou de creches, que a cidade precisa de creches – nos concordamos com ele e sabemos que tem muita criança em São Paulo sem creche.
Na proposta da prefeitura, a empresa que ganhar o terreno terá que construir 200 creches na cidade. Nós sabemos que creche é muito importante e toda criança tem direito a uma, mas deve ter outro jeito de fazer essas creches sem ter que derrubar a minha biblioteca, o teatro, duas escolas, uma creche, dois serviços de saúde e a Apae, construir um prédio de apartamentos no lugar, e acabar com o quarteirão que conta a história do meu bairro e da minha cidade. A minha biblioteca está lá desde 1946, é a primeira biblioteca infantil de bairro da cidade de São Paulo e foi o Monteiro Lobato que escolheu o terreno onde ela está até hoje.
No final da apresentação os conselheiros fizeram umas perguntas ao secretário – perguntas bem legais, que eu gostaria de ter feito – e o secretário teve dificuldades para responder. Nessa hora, como a gente não podia falar nada, batemos palmas. Foi o nosso jeito de participar e defender o quarteirão. Depois pedimos desculpas à presidente, e ela disse que tudo bem, que nós até que fomos muito bem comportados. Nós vamos ter o direito de apresentar “uma réplica” lá no Condephaat para mostrar a “nossa posição” aos conselheiros. Assim que for marcado o dia dessa apresentação, eu conto aqui.
Não se esqueçam da festa na próxima terça-feira. É o aniversário do bairro e a programação está no post anterior, vejam lá e apareçam. Vamos aproveitar pra continuar a nossa luta em defesa do quarteirão e conseguir mais apoio para o nosso movimento.