Hoje vou falar do outro livro que eu ganhei do meu pai, no dia em que eu fui ao sebo: O menino mágico, da Rachel de Queiroz. Eu gostei muito do jeito que ela conta a história desse menino!
Eu já tinha ouvido falar da Rachel de Queiroz, mas nunca tinha lido nada dela. Eu lembro que na Bienal, numa das palestras que eu assisti, um escritor disse que para escrever a pessoa tem que viver bastante, ter experiência e muita informação na memória. Na memória dela e não do computador. Ele disse também uma coisa mais ou menos assim: “ninguém cria uma obra-prima com vinte anos de idade e não é todo dia que aparece uma Rachel de Queiroz”. Naquele dia fiquei curioso e fui pesquisar sobre a vida desta escritora: ela nasceu em 1910, em Fortaleza, no Ceará e mudou-se ainda criança para o Rio de Janeiro, com a família, fugindo da seca. Em 1930, com vinte anos, publicou o seu primeiro romance, O Quinze, em que conta um pouco desta história. Este livro foi muito elogiado pelo público e pela crítica daquela época (uma obra-prima!) e fala da pobreza e do sofrimento do povo nordestino com uma grande seca que teve em 1915. Depois desse seu primeiro livro ela escreveu outros: Caminho de Pedra, As Três Marias, o livro de crônicas A Donzela e a Moura Torta, A Beata Maria do Egito, Dora Doralina, a peça de teatro Lampião, e muitos outros. Com Memorial de Maria Moura ela ganhou o Prêmio Camões, de melhor autor de língua portuguesa de 1992. Rachel de Queiroz foi a primeira mulher a entrar para Academia Brasileira de Letras e além de escritora foi jornalista e tradutora . Ela morreu no Rio de Janeiro em 2003, aos 92 anos.
O Menino mágico é o seu primeiro livro infanto-juvenil e foi lançado em 1969. A edição que eu peguei no sebo é de 1983, da José Olympio Editora e tem ilustrações de Gian Calvi. Mas tem edição nova na livraria, da Editora Caramelo. Depois deste, ela escreveu Cafute e a Pena de Prata e Andira. Quando eu vi esse livro na estante do sebo, logo me lembrei do que falou o escritor da Bienal e separei pra mim. – Tenho que ler esse livro! Quero conhecer a grande escritora que publicou o seu primeiro romance com 20 anos.
O Menino mágico conta a história de Daniel, um garoto de seis anos que aprendeu a fazer mágica, sozinho, “sem estudar prá mágico – aliás, ele nem gostava muito de estudar. Pra não dizer que não gostava nada.” É muito engraçado o jeito de ela contar a história, parece uma criança que sabe de tudo e conhece muito bem o Daniel. O menino “deu para fazer mágicas de repente – ele mesmo não desconfiava, mas um dia descobriu. Aconteceu que, uma noite, foi dormir no quarto dele e quando o dia amanheceu já estava dormindo em outra cama, em outro quarto.” Essa foi a sua primeira mágica. Outro dia ele até já tinha se esquecido de que era mágico, quando entrou na cozinha e viu a cozinheira separando alguns ovos. Ele pegou num dos ovos, a cozinheira chamou sua mãe e gritou: – Menino, larga esse ovo! E ele disse: – Isto não é um ovo, é um pinto. Ele fechou a mão e os olhos e inventou uma reza forte: “Faz de conta que era. Faz de conta que não era. Começou de ovo, acabou em pinto.” Daniel apertou o ovo com toda a força até a casca estalar e depois foi afastando os dedos devagarzinho, sentiu uma cocegazinha e aí abriu a mão toda. Na palma da mão do menino não tinha clara nem gema escorrendo, tinha era um pintinho, bem amarelinho. Depois disso o Daniel virou um mágico de verdade, mas não saiu por aí fazendo mágicas sem necessidade. Ele só fazia mágicas quando precisava ou quando queria sair de alguma enrascada. Daniel tinha um irmão mais velho, mas que não brincava com ele. Toda brincadeira que o Daniel inventava ele dizia que era brincadeira de neném “e se havia coisa que Daniel ficava mais furioso da vida era com quem dizia que ele ainda era neném”. Daniel também tinha um primo de sete anos, o Jorge, um menino muito inteligente e o seu melhor amigo. Jorge estava sempre inventando coisas. E com as ideias de Jorge e as mágicas do Daniel os dois meninos viveram muitas aventuras e até em programa de televisão eles foram.